sexta-feira, 25 de março de 2011

Manual do crente: o nosso mundo e o mundo deles


A maior divisão entre pessoas na face da terra é a separação entre os crentes e os não-crentes. Existe uma cratera separando esses mundos e a comunicação entre eles se dá mais por espiões que transitam entre essas duas construções, ou arrependidos de um ou de outro lado que migram para a fronteira inimiga e assim passam a conhecer ambos os mundos. Para os crentes existe um mundo espiritual, que seria a verdadeira realidade da vida. Aqui, passamos por uma fase, a vida mesmo acontece depois; quem não tem fé está fadado ao ostracismo do inferno. Logo, não crer é não ser deste mundo.


A diferença é que produz a beleza deste mundo. Se todos fossem iguais, viveríamos num “Admirável Mundo Novo” e aquela visão excruciante de um mundo de castas e cores pré-definidas dói só de ser pensada. Mesmo assim o mundo é apolíneo por definição. A religiosidade é vivida num universo impregnado de falsas ideias. Construir uma nova divisão, num mundo que já é completamente dividido em várias outras áreas do viver, é ponderar com o impossível. Para o crente o mundo deles é o melhor dos mundos, e o que subsiste nesse hipotético mundo, são questões sobre como podem os outros não fazerem parte dele.

Os crentes creem habitar um universo diferente dos não-crentes; mesmo inexistindo uma certeza racional para a existência desse mundo encantado, esse reino metafísico que enche a cabeça e esvazia o corpo. Qual seria a localização exata desse mundo? Como encontrá-lo? Quem sabe alguém possa, como Galileu que fez os cálculos exatos da localização do Inferno, indicar esse reino espiritual; se olhamos para o céu vemos nuvens, e não um soberano de barbas brancas sentado nele com uma imensidão de almas boas vagando felizes e prazenteiros.

A grande realidade é que se você é daqueles que responde questionários dizendo-se sem religião, você, aos olhos dos crentes, torna-se um pária. Para eles não é possível que você não queira ter essa dupla cidadania: a terra e o reino dos céus. Invariavelmente o tratamento dispensado para você, um não-crente, será o mesmo dispensado para o lixeiro, para o pedinte, você ou se tornará um ser invisível ou será agraciado com toda a atenção do mundo, por se transformará numa obsessão do outro; o crente ou te abandona às traças ou quer ter converter à força se der, pois acham que é só sair repetindo trechos e trechos da Bíblia que você se comoverá.

Mas é claro que existem amizades entre crentes e não-crentes, mas será sempre uma amizade receosa. Essa barreira existencial advém da dificuldade de compreensão, mais dos crentes do que dos não-crentes, pois para o crente qualquer brincadeira envolvendo, mesmo que de maneira distante, religião, logo termina em calorosas discussões. Para os crentes se você não crê, logo não pode, em hipótese nenhuma, emitir pareceres sobre o mundo livre de amarras como você quer. Isso pode ser ouvido e futuros crentes podem ser tocados em sua incipiente fé e abandonarem o futuro barco.

O problema maior é como conseguir penetrar no mundo do crente, geralmente isso se dá de uma maneira bem simples, o não-crente abandona o seu mundo e passa a professar alguma fé, de maneira nenhuma são admitidos turistas naquele mundo. Ou se entra inteiro ou fica de fora dessa grande festa possível. Agora se você não quer se converter resta a você visitas extemporâneas. Como para o não-crente tanto faz como tanto fez o modo que o crente leva sua vida, desde que ele não tente de maneira ostensiva furar essa fronteira entre-mundos, com pregações vãs, logo é possível a convivência pacífica. O mesmo não pode ser dito dos crentes que acreditam piamente ser impossível que alguém não creia em céu, Deus, Pai, Filho, Espírito Santo e santos, e andam sempre a apontar o dedo para os problemas terrenos dos não-crentes e dizendo: “viu, fulano morreu de tal doença pois não acreditava em Deus”. Pode? Não pode.



a.p.

Nenhum comentário: