quinta-feira, 7 de abril de 2011

"O mundo das palavras encolheu"


Havia um tempo em que a palavra comandava todas as ações. Vivia-se a palavra com muito mais ênfase do que se vive hoje. Na Bíblia está: "E Deus disse: faça-se a luz e a luz se fez"; desse princípio simbólico para a palavra até os dias atuais essa mesma palavra alcançou os píncaros da glória e hoje definha a olhos e ouvidos vistos. A palavra tinha tanto poder que nenhuma grande proposição daquelas que mudaram o mundo surgiram ser estar ancoradas nela. No tempo em que não existiam telescópios poderosos pretender informar que a Terra girava em torno do Sol só era possível através de textos, muito bem escritos. Darwin só revolucionou o mundo com o seu "Origem das espécies" pois suas palavras fizeram sentidos para a multidão de leitores e detratores dele. Freud criou a psiquiatria porque as suas explicações eram muito convincentes para quem o lia. Deus só existe como construção quase real, pois a sua "palavra" existe, e é palpável, podendo ser lida, relida e interpretada através da Bíblia, do Corão, etc. Shakespeare sozinho é responsável pela criação de mais palavras que algumas pessoas nunca falarão. De lá pra cá fomos desaprendendo, ou quem sabe fomos terceirizando a palavra separando tudo em mínimas partes. Um matemático russo consegue se entender com um matemático islandês somente através das fórmulas matemáticas, eis o silêncio da palavra. Com o passar do tempo, com a fraqueza das escolas, das famílias, dos alunos, é muito mais cômodo e prático reduzir o número de palavras empregadas, chegando assim a quase existir um linguajar de encomenda. Assista-se a televisão e ver-se-á que nos jornais não existe lugar para repórteres rebuscados, com linguajar escorreito e perfeito, pois os mesmos perdem a razão de ser quando se sabe que fala para milhões de ouvintes que esqueceram há tempos o significado de uma quantidade enorme de palavras. Ocorreu uma doutrinação pelo menos, a quantidade de palavras utilizadas beira ao semi-analfabetismo. As palavras, com a comunicação de massa, perderam o poder de conotação. As figuras de linguagem e de pensamento foram abolidas, escanteadas. Na literatura de hoje em dia o escritor precisa dizer muito mais com menos recursos, não pode se debruçar sobre o vasto repertório existente sob pena de ser considerado pedante, arrogante. Os leitores na maioria das vezes não conseguem ir além das proposições mais simples. Hoje quem comanda o mundo é a linguagem da informática, nós, pobres seres humanos, capengamos nesse mar de novidades, teclando cada vez menos palavras, para darmos conta de tanta informação que nos circunda e que nos atravessa. Somos trespassados pelas palavras, mas as palavras já não significam tanto. A palavra de hoje em dia está gasta, como propôs Steiner. A utilizamos até o limite, e compreendemos, enfim, que para sermos atendidos em nossos desejos temos a necessidade mais da potência, brevidade e repetição do grito que da força de uma grande exposição. Em tudo isso se vê a mão obtusa do mercado. Uma propaganda não necessita de grande quantidade de palavras para ser entendida, logo, como se consegue vender produtos com jingles e não mais com músicas, com bordões breves e obtusos até, por extensão vamos desnecessitando de uma grande quantidade de palavras para nos comunicarmos e elas vão sendo abandonadas aos dicionários.




s.e.s

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