quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

O velho amor


Sempre gostei de Gabriel Garcia Marquez, o Gabo, mas nunca tinha visto uma obra dele ser transposta para outro meio que não as páginas indeléveis dos seus generosos livros, agora já vi. Cinema para mim é algo que precisa transmitir alguma coisa, um sentimento, um sentido qualquer. Quero emoção, sorrir, gargalhar, chorar. O filme O Amor nos Tempos do Cólera bate na trave em todos esses quesitos. A fotografia é bela, as locações são maravilhosas, quando surge a Fernanda Montenegro é quase sensacional, Javier Bardem está bem como sempre, pero fico mais tocado quando a Shakira canta, isso é uma boa medida do valor do filme.

É que me incomoda algumas coisas que, faça chuva ou sol, sempre encontramos nas obras do Gabo. O supermacho latinoamericano, que sempre se torna o supervelho latinoamericano. Acho que se hoje existe o Viagra, muito deve ser creditado a Marquez na busca dos pesquisadores, eles deviam ler seus livros, onde homens quase centenários ainda copulam como jovens, ainda são capazes de conquistar 'jovenzitas', e deviam trabalhar horas e horas atrás daqueles mesmos efeitos mágicos. Aqui tudo de novo, o homem sensível, com uma história de amor impossível (que já sabemos ser a dos pais dele), a queda e a ressureição, e para não fugir à regra, números, que para o super-homem que interessa ao autor é muito valioso, Assim Florentino Ariza diz a certo momento do filme ter transado com 622 mulheres, então tá e eu sou o Bozo.

E assim entramos também no momento que realmente importa da história toda que é quando Florentino enfim conquista Fermina Daza. Estamos agora no universo espinhoso para o cinema, no livro um relacionamento sexual entre um idoso e uma idosa é algo que toca profundamente quem lê, no cinema isso não toca e sim causa uma certa apreensão em quem assiste. É algo complicado de se falar, é como quando em Ghost a Demi Mooore vai beijar a Woopi Goldberg, mas para deleite de todos ela beija o Patrick Swayze, qual seria a reação do público se mostrasse o beijo real e não o imaginado? Deve ser a mesma sensação que dá, e não é preconceito, é só falta disso ser algo normal e natural. Como no livro do Cristovão Tezza onde ele fala da dificuldade para um pai (ele) aceitar um filho (o seu) com Síndrome de Down, são fatos que não são a regra e sim exceção, e para elas só estaremos prontos quando vivermos isso na própria pele. Todos envelheceremos, como iremos lidar com a nossa sexualidade quando o corpo de outrora for passado e a mente ainda mandar sinais de fumaça para o resto do corpo? São novidades do neo-futuro que todos viveremos, se conseguirmos chegar lá.

Quanto ao Gabo ele continua criando heróis do sexo idoso, como o velho de Memórias de Minhas Putas Tristes, isso é algo que é melhor nos acostumarmos, não tem mais volta. Quanto ao filme enfim, foi uma bola na trave, não conseguiu me emocionar nem para escrever um texto no dia seguinte a que vi o filme, só hoje, quando procurava um assunto para falar e me lembrei que o havia visto. Mas valeu, ver a Fernanda interpretando um bom papel numa grande produção americana é algo que por si só já paga uma entrada do cinema, e Shakira...


s.o.

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