segunda-feira, 28 de abril de 2008

Fabrício Carpinejar


Fabrício Carpinejar, Poeta, Jornalista, Mestre em Literatura, Gaúcho, 35 anos. Tem doze livros publicados. Seus textos são marcados principalmente pela arte de poetizar o cotidiano, enxergar a beleza oculta nos acontecimentos mais corriqueiros. Em seu mais recente livro, Meu Filho, Minha Filha, decanta as sensações paternas diante do universo infantil. Também traz sempre novidades poéticas em seu blog, no qual publica crônicas quase diariamente. Além disso, viaja por todos os cantos do país liderando palestras nas quais trata da Literatura sempre com o máximo bom humor, deixando os participantes sempre num clima de imprevisibilidade e de riso quando Carpinejar começa contar as histórias dele, supostamente biográficas. Recentemente esteve em Campo Grande, onde presenteou a cidade com mais um módulo de sua Oficina de Construção Poética e nos intervalos desta, nos concedeu uma entrevista-bate-papo

Fabrício, como seus filhos receberam Meu Filho, Minha Filha?

Fabrício Carpinejar: Eles não têm obrigação de receber. A Mariana leu e disse: “- ótimo... exagerou um pouco...”. Eu li alguns poemas pro Vicente, ele tem seis anos agora, ele disse “- vamos jogar futebol agora?”. Eu não escrevi o livro para a minha família, eu escrevi o livro pra sair dela, para tentar reequilibrar a figura do pai, porque é uma figura ainda muito subestimada. O pai não tem realmente os mesmos direitos que a mãe na justiça, o pai, pra ficar com o filho, ou a mãe não quer ou haverá maus tratos, mas se a mãe é boa, como realmente todo mundo quer que seja, não tem igualdade de condições.

Explique “eu deixei de ser teu pai para ser a pensão da tua mãe”...

F.C.: Isso é a coisa mais difícil pela qual um pai pode passar. Eu pagava a pensão pra minha filha, em acordo verbal, e de repente eu recebo: “Mariana Carpi Nejar versus Fabrício Carpi Nejar”, é um baque. É uma violência simbólica. Eu acho legal a pensão, mas é uma violência simbólica você perceber que é real da tua filha. É uma violência simbólica, sem que a criança saiba, porque a criança não tem como pesar isso. Tem de ter um cuidado para o pai não sangrar, porque se o pai sangra o filho sangra junto; da mesma forma, se eu atingir a mãe dela, eu estou atingindo minha filha. Como é que eu vou atacar a casa dela? Colocar a pedra no chão é muito mais difícil que arremessá-la...

Então pisa-se em cacos, sem direito a revidar?

F.C.: Eu acho que é uma mistura trágica da figura do marido e da figura do pai. Muitas mulheres não conseguem distinguir, elas acabam tratando do marido, esquecendo que ele é pai. A criança vai receber o quê, vai receber o pai ou o marido da mãe? O marido. “Ah, ele me abandonou, ele não me amou, ele foi um canalha...”, de repente o cara foi um ótimo pai pra criança, e pra criança ele é tudo de bom. Acaba criando um adepto, correligionário; isso é terrível, e a criança acaba depois na adolescência cobrando do pai.

Fabrício, você acha que a juventude lê pouco? Se sim, que motivos você atribui a isso?

F.C.: Acho que a juventude não lê pouco, lê tanto quanto antes. Talvez ela não leia tanto livro, mas ela lê. Na internet, por exemplo, ela tem mecanismos de leitura: revistas digitais, sites, blogs. Eu acho que ela está perdendo um pouco a seqüência, ela está perdendo o enredo. A gente está transformando a leitura num zap de tevê.

Isso é bom ou ruim?

F.C.: É outra tensão, muito mais dispersiva, mas eu não sei até que ponto isso é ruim. Antes criticavam a minha geração, que é a geração da tevê, dizendo que ela seria totalmente alienada, e a geração do videogame, e descobriram que essa é a geração mais concentrada, pois o videogame ajuda na fixação das imagens. São tabus. O mercado do livro caiu muito, mas eu não sei se diminuiu a leitura. Talvez seja uma época da safra dos romances exóticos: se tem um romance, por exemplo, da Ásia, todo mundo quer ler, o pessoal quer fugir dos seus problemas.

Informação, conhecimento e sabedoria: o jovem ele tem acesso à informação pela internet, mas ele tem de processar essa informação para que ela se transforme em conhecimento, e sempre estar se reciclando, para que esta informação vire sabedoria. O jovem não está tendo um excesso de Informação, sem que consiga alcançar o resto?

Não é um problema só do jovem, também é do adulto. Há uma precocidade no texto, que atinge todas as faixas etárias. O que nos dava um elo eram as histórias da família. A contação de histórias, porque a nossa fonte é a família; a gente confirmava as informações como os pais. Isso está se perdendo, a gente não tende a reconhecer a sabedoria dos mais velhos, porque ficamos distante deles. Se alguém vai contar uma história para nós e fica dando voltas, a gente já sai de casa.

Na lista de livros mais vendidos, chovem Dans Browns, Caçadores de Pipas, Paulos Coelhos. O mundo emburreceu?

F.C.: Não, é exotismo. Porque tu vai ver que tem livros bons ali. A gente não pode dizer que Caçador de Pipas é ruim, bem melhor que Paulo Coelho. A Menina que Roubava Livros é um bom livro, Reparação do Ian McEwan é um romance muito bom, é deprimente no começo, depois é um sufoco voltar para casa e ser feliz, um sufoco!

A literatura hoje parece uma necessidade das pessoas de afirmação, de encontro, é uma busca individual. Seria essa a razão do sucesso desses livros?

F.C.: O grande marketing do livro ainda é o boca a boca. São livros que um recomenda ao outro, uma inveja, “- ah ele tem esse livro? eu quero ter". Reparação entrou na lista, foi lançado há mais de cinco anos. Ele foi relançado, em função do filme, assim como Tropa de Elite, assim como Meu Nome não é Johnny... porque atinge um grande público, sai daquela casta dos iniciados.

É uma literatura mais fácil?

F.C.: Vá lá: Morte e Vida Severina, virou seriado de TV, é um poema dramático, um auto de Natal de João Cabral de Mello Neto. Na época que virou um seriado de TV o livro despontou, é um livro absurdo, mas é um belo livro e teve uma ótima adaptação, assim como Grande Sertão: Veredas. É justamente a adaptação que vai fixar o livro.

Seria uma espécie de popularização, de treinar a deglutição do livro?

F.C.: É exatamente. O importante do livro é ser lido. Aliás, nem sei se os livros da lista são lidos, são comprados, isso eu tenho certeza, comprados são, está na lista.

Muitas vezes, entre o livro e o filme, a pessoa opta pelo filme, e não lê o livro porque ela acha que ali vão estar todos os elementos que tem no livro...

F.C.: Em alguns momentos o cineasta acerta, o Reparação é muito fiel ao livro, Meu Nome é Johnny é também é muito fiel. Não sei...

Desse modo a pessoa não lê o livro.

F.C.: Sim. O pior é que no Reparação eu não li o final do livro, não quis ler o final, aí eu fui ao cinema para assistir, sabe o que aconteceu? Faltando dez minutos falta luz no shopping...

Castigo...

F.C.: Total, vou ter que voltar a ler o livro.

Você acredita que em um autor vida e a obra se misturam?

F.C.: Não pode terminar na vida do autor, mas pode partir dela; Tu quer a vida dele, só que não é biografia, é literatura. Eu tenho medo de encontrar os autores que eu gosto, tenho uma imagem tão bonita e cativante deles, e de repente, o cara não é espirituoso. Muitas vezes tu coloca na obra aquilo que tu não é na sua vida, isso tem que ser levado em conta, é uma saída. Eu faço questão de confundir minha vida com a minha obra, é uma delícia.

Você não tem medo de daqui alguns anos sair uma tese analisando você e sua obra?

F.C.: Eu não sou polícia para reprimir, mas a minha vida é inventada, por isso eu sou biográfico. Nem a minha mãe sabe o que é real ou mentira, eu confundi tanto a minha mãe que tu pode perguntar para ela, que ela não vai ter certeza.

Vamos fazer um exercício de imaginação kafkiana: você vai perder um dos sentidos. Qual o poeta Fabrício Carpinejar escolhe pra ficar sem?

F.C.: O nariz é o meu latifúndio improdutivo. A questão do ouvir para mim é muito importante, ouvir uma música, o ritmo. O tato é minha visão, antes de tudo. Uma mulher, por mais exuberante que seja, precisa ser vista com o dedo, com o toque. A visão não é a fundamental, ainda mais se eu perdesse hoje a visão: eu já teria como encontrar as coisas. O cheiro, assim, ver pelo cheiro... não sei, é uma pergunta islâmica essa....

O que mais te encanta então?

F.C.: O que mais me seduz é a narração, se ela me conta uma história é muito mais que visual, eu sou aficcionado por Mil e uma Noites em função disso, ali eu acho que trabalha essa questão, a fantasia, seduzir, explorar, saber provocar, ter personalidade para fazer isso, senão é “ah não sei”, “ah não quero”, “faz o que tu quiser”, isso é tão chato, “escolhe você”, não ter personalidade nenhuma, uma submissão, seguir o que outro está fazendo, seguir o que ela tá fazendo, não. Você pode escolher, mas eu quero ver a outra pessoa escolhendo, tem que saber errar também.

Suas palestras são sempre muito explosivas, e suas aulas também são assim. Você acha que a monotonia dos professores colabora com a inércia e a falta de interesse dos alunos?

F.C.: Tem que ter a questão do confronto, o aluno ele precisa ser incitado, não é para ser uma amizade fácil, precisa ser uma amizade estimulante. O desejo do escritor e do professor é que o aluno realmente o supere. O aluno precisa se superar, precisa questionar, e ser questionado. Gosto muito de ensiná-los, o que pra eles é apenas mais quatro horas para mim é tudo, aquilo para mim é minha vida. Isso interfere, a diversão também, você tem que se divertir na sala de aula.

Pode haver conteúdo e show numa mesma aula?

F.C.: O conteúdo é o show. Ter um conteúdo que é explosivo é show, mas o professor tem que ter sustentação psicológica, emocional, porque ele encontra resistência, retração. Chegar numa aula e falar coisas que as pessoas não admitem que possam ser ditas numa sala de aula, como sexo, por exemplo, ainda trava as pessoas.

Você leria o texto Involuntariamente Pornográfico - numa sala de aula?

F.C.: Sim, é um texto feito para isso, pra provocação, depois daquele texto, você acaba se sentindo invadido e reequilibra a intimidade. A gente tem vergonha de coisa que a gente não precisa ter, a gente precisa ter vergonha por exemplo da indiferença, da omissão, da competição. A gente precisa ter vergonha de um monte de coisa, vergonha do roubo, não vergonha disso, a gente acaba assumindo uma vergonha que não é pra ter vergonha, é o corpo é a liberdade do corpo.

Sexualidade: como você vê a maneira como as mulheres lidam com ela?

F.C.: As mulheres se cobram demais; elas querem ter respostas, respostas, respostas... A mulher assumiu um espaço que é delas, só que não deixou os espaços que ela tinha antes: continua com a casa, agora tem trabalho, agora tem que gozar, quer ser mãe; é muita coisa! O homem faz o que pode, a mulher quer a unidade, quer o conjunto, quer tudo, quer ser um pouco mais. Uma fome...

De abraçar tudo, de proteger tudo?

F.C.: É uma fome de mundo, de proteger, de se sentir protegida, de ser entendida, de ser explicada, porque para a mulher não basta sentir, ela tem que explicar o que está sentindo, o homem sente e não precisa explicar.

O homem ainda acha que domina o relacionamento?

F.C.: O homem não domina um relacionamento, o amor deve ser o único sentimento que dizima, que deserda. Eu sinto falta da dor de cotovelo, de chorar no bar por uma mulher, isso é bonito, descascar o rótulo de uma garrafa, beber até perder a consciência por uma mulher, sem contar outras situações vexatórias...

É uma falta de dignidade bonita?

F.C.: É luto. O homem é muito cobrado, tem de provar a toda hora que é homem. Passa a vida inteira provando que é homem, para os seus amigos, nas brincadeiras, escola, em casa. Quanto tempo nós demandamos da nossa vida para provar que somos homem? Muitos anos, pode somar, dá muito tempo! Por isso que eu acho que tem a inteligência gay. O gay não precisa provar que é homem, e também não é como a mulher que se cobra. Como tem tempo disponível, ele acaba sendo muito mais sofisticado na música, nas relações, muito mais amigo, muito mais humorado... Acho que os homens tem de aprender com a inteligência gay.

O gay está muito mais próximo da mulher...

F.C.: Mas é evidente. A mulher cobra do homem também masculinidade. Começa o relacionamento ela tá cobrando, e pode ser nas situações mais elementares, abrir a lata de pepino, matar barata, são obrigações de homem, trocar lâmpada, são obrigações de homem, não é? Carregar....ah pára; não, elas confundem homem com estivador.

Quando você encontra um livro seu no sebo, o que sente?

F.C.: Eu não me sinto rejeitado, mas têm poucos livros meus autografados no sebo. O público tem o direito de não gostar do que eu faço, e isso também é uma visão que o escritor precisa aprender, precisa absorver: a humildade. Quando que a gente escreve entramos numa certa paranóia de todo mundo ter de gostar, a gente condena os outros a gostarem da gente, não admitimos nenhum contraponto. De repente sua obra pode ser ruim, tu tem que aceitar isso. Ninguém tem a grandeza de te botar no chão, mas você precisa dar o direito de escolha.

Como você lida com as críticas?

F.C.: Se ela não ataca a vida pessoal, não é sarcástica, eu acho que é bom. Mas se ela não respeita minha vida pessoal, eu fico chateado mesmo. Se for uma crítica legal eu recebo numa boa, ainda mando “-agradeço a leitura do livro”, isso eu aprendi. O Faulkner dizia o seguinte: “escreve uma resposta, vai lá escreve uma resposta, depois lê, lê uma segunda vez, e rasga. Você já respondeu, só não precisa entregar”.

Como o povo gaúcho vê a sua poesia?

F.C.: Tenho uma empatia muito grande com o público gaúcho, a luz de Porto Alegre é uma luz coada, eu sinto falta. Às vezes se eu fico mais de uma semana fora de casa minhas personalidades cindidas começam a se afastar, só minha mulher para reunir minhas personalidades. A amizade ajuda a literatura, a literatura brasileira cresceu em função de grandes amizades, Drummond amigo do Fernando Sabino, que era amigo Rubem Braga, que era amigo do Hélio Pelegrino, que era amigo do Otto Lara Resende; um competindo sadiamente com o outro...

Estão faltando elos na literatura?

F.C.: Ambição, a ambição faz os elos. Na verdade, se uma pessoa é muito boa, você se afasta dela. Nem leu a obra nem nada, diz que é metido e tenta criar fofocas a respeito. Se tu percebes que tem um baita talento na tua época, o que não é uma coisa fácil, tu não vai dar força? Não vai chegar perto? É um crime!

Qual a coisa mais absurda que você já vivenciou como poeta?

F.C.: Tem uma história engraçada: eu fui convidado para celebrar um casamento, agora, no final de março. Já fui padrinho, já fui o marido, agora eu vou celebrar um casamento. Um casal de leitores da minha poesia parte do princípio que nada melhor que um poeta para celebrar o amor. Vou ser padre!

Qual a maior qualidade de Campo Grande?

A maior virtude de Campo Grande é a contação de histórias, então as pessoas elas são contadoras de histórias mas não lêem, isso é um paradoxo. Porque aqui acontece diferente de outros estados, no Rio Grande do Sul, se você é um contador de histórias, você lê, a contação de histórias leva pro livro, o livro leva pra contação de história, aqui a contação de história só leva para a contação de histórias, a pessoa não sente necessidade do livro, o livro é dispensável. Não sei se é pela ausência de bibliotecas familiares, não sei, pode ser. Porque se você forma uma biblioteca, você sabe que ali tem uma história pra ser contada. Eu não entendo porque aqui a literatura é vista como literatura não é como vida. Teu melhor dos relacionamentos é com a literatura. É que as pessoas não entendem a literatura como reflexo de uma atitude, como reflexo de uma vida, como reflexo de uma escolha. Você pode ser médico é a leitura que vai te tornar um médico melhor , se for psicólogo é a leitura que vai te tornar um psicólogo melhor, latifundiário, é a leitura que vai te tornar melhor. É o trato com as pessoas; só que eles percebem a literatura com se fosse...

Um universo paralelo?

F.C.: Um universo paralelo, é isso. Acham que não é necessário, que não é fundamental, que parece conversa de louco. Talvez o grande papel de todo o país seja formar leitores, não escritores, leitores sem a ânsia de publicação. Leitores jornalistas, funcionários públicos. Que lê o livro pelo prazer de ler, não por querer escrever.

É possível um leitor que não queira escrever?

F.C.: Claro que é! Grandes escritores são feitos desses leitores. Se a gente escrever para escritores, nosso público é muito limitado.

Um grande escritor não é antes de tudo um grande leitor?

F.C.: O grande escritor é um grande leitor, mas um grande país é feito de grandes leitores que não precisam escrever. Nós somos apaixonados pela literatura e a gente não consegue pensar nisso de forma diferente. Mas se tu pode apenas ler só pelo seu prazer e isso é que vai fazer a lista dos mais vendidos.

O que fica de Campo Grande pra você?

F.C.: Eu gosto muito daqui. Talvez sejam as pessoas de quem eu me aproximo, eu não sinto fingimento. Mas algumas coisas que acontecem aqui me incomodam: a falta de editoras, a ligação da literatura com a coluna social, a pouca sintonia entre a música e a literatura, a ausência de literatura urbana. Literatura urbana, cidade, cadê? Parece que tu não tá no Pantanal tchê,..... As pessoas falam: “eu estou escrevendo em Campo Grande, então eu tenho que escrever à moda Manoel de Barros”. E quem disse que Manoel de Barros reproduz a obra de Campo Grande? De repente não. É uma coisa que tem que se saber. Quem é nossa voz genuína? Mas no Rio Grande do Sul se você vai pegar tem uma literatura iminentemente urbana, já teve toda uma literatura que preservava o passado, uma literatura mais aguerrida, o romance histórico, assim por diante; depois teve outros avatares; mas hoje se você vai pegar, literatura urbana, tem um sentimento político, Paulo Scott tu sente a cidade, Daniel Galera tu sente a cidade, a cidade é personagem, Amílcar Bêttega, Porto Alegre tá lá, o cais tá lá, o morro tá lá, tudo tá lá. É maravilhoso deslizar por descrições das tuas ruas, e dizer: “eu passo por esse livro todo dia”, ver um filme e assistir a tua cidade ali. Acho que a partir disso tudo se abre.


* Entrevista concedida dia 14/02/08, no Hotel Jandaia em Campo Grande/MS.


Thanks 1: Fabrício pela hora de conversa "totalmente excelente" que tivemos, mais do que uma entrevista foi um bate-papo que podia se estender indefinidamente que, pelo menos nós, não reclamaríamos.


Thanks 2: Aline pelo MP3.


Thanks 3: Para a equipe de produção, ou seja, nós mesmos: s.o./t.c./g.y.

sexta-feira, 4 de abril de 2008

A primeira vez num sebo


Confesso um pecado intelectual: nunca tinha visitado com tranqüilidade um sebo. Mas sempre tem a primeira vez. Acabo de sair de um. Ao me encaminhar para o ponto de ônibus fui meio zonzo ainda meio extasiado por tanta magia.
Ver as infinitas lombadas de livro é como ver uma multidão de mulheres maravilhosas de perfil, enfileiradas como dominós em pé. Agora inventaram o tal Estante Virtual, uma economia que nos rouba um prazer. Nada como o prazer de molestar os livros, folhear suas páginas, violar suas páginas, como se faz com o vestido da mulher amada. Aí que raiva, encontrei tudo que queria! E é justamente esse o problema. Encontrei tudo o que queria, só me falta encontrar todo o dinheiro que queria. Por mais que os sebos se apresentem com preços módicos, mas são tantas emoções! Dá vontade de levar tudo para a casa.
Nessas horas que reconheço a importância dos analfabetos funcionais. O que seria de nós se não existissem aqueles que não gostam de livros, que não os entendem? O que seria de nós se simplesmente não existissem aqueles que odeiam ler? Sebo é um orfanato de sonhos. Arrepio-me quando vejo páginas amareladas olhando para mim, dedicatórias que nunca me foram feitas. Uma sucessão de rabiscos que me enchem os olhos. Encontrar rabiscos em livros me faz me sentir menos só, pois há um diálogo entre mim e o leitor anterior e me dá certeza de que a leitura não é um prazer solitário. Quando leio meus cinco sentidos se despertam. Afago o papel, sinto o cheiro envelhecido ou o frescor da celulose, saboreio as palavras, vejo as palavras minuciosamente desenhadas como o sistema solar, ouço o tilintar da virada de cada página como uma lenta melodia.
Definitivamente a leitura faz as pessoas mais interessantes. Homens e mulheres não são mais os mesmos. As conversas são cada dia mais requintadas. Para muitos sempre seremos chatos, nerds, e ignorarão a nossa existência, a nossa convivência. Perdoe a eles senhor, não sabem o que fazem!
t.c.s.